De lá - o destaque é nosso: «(...) Este texto parte da observação de Mazzucato e pretende evidenciar o que de falso existe numa lengalenga que têm vindo a ser contada, à exaustão, a qual, como todas as lengalengas usadas pelos poderosos, tem motivações políticas, pretende ter efeitos políticos, nomeadamente, condicionar a ação e as opções eleitorais de cada um de nós. Falo da lengalenga que o comentariado nacional difunde sobre a alteração do mapa eleitoral do Alentejo (e também no distrito de Setúbal), assente no argumento de que a quebra do eleitorado da CDU é o fator explicativo da subida galopante do Chega.
A lengalenga foi profusamente utilizada em 2024, ano do grande sobressalto causado pelo crescimento do partido de André Ventura, e continua a ser utilizada depois do passado dia 18 de maio, dia das eleições legislativas que reforçaram a progressão eleitoral do Chega também nos distritos do sul do Continente.
André Ventura, num comentário ao nível do que o Chega é, marcou o ponto na noite eleitoral: «O Chega matou o partido de Álvaro Cunhal». Também Ascenso Simões, militante socialista, alimentou a mesma leitura no seu «O Chega sempre esteve dentro do CDS, do PSD e do PCP», publicado na sequência das eleições no Expresso online, e, em certa medida, também Pacheco Pereira foi no mesmo balanço quando escreveu no Público (24.05.2025) «O mapa eleitoral do Chega é muito parecido em várias partes do país com o do PCP».
O argumento não circula apenas no comentário político. Já na edição de 25 de abril, do jornal Público, os jornalistas Ana Bacelar Begonha e David Santiago alimentaram, de forma descuidada, esta lengalenga, lançando a questão a Paulo Raimundo: «em muitos dos sítios onde a CDU precisa de recuperar representação é onde o Chega elegeu [particularmente] no Alentejo (…). O que é que a CDU pode fazer para recuperar votos que perdeu para o Chega?».
Esta lengalenga é um exemplo do que Mariana Mazzucato nos explica no seu livro: uma narrativa que os poderosos inventam e difundem (pela voz do comentariado de serviço) para melhor atingirem os seus objetivos políticos, isto é, os seus objetivos de poder. Contudo, também esta lengalenga merece o selo de «aldrabice». Certamente, uma aldrabice assumida, porque tem um fim claro: criar uma ideia (sem qualquer suporte de evidência) de definhamento e apagamento da CDU até nos «tradicionais bastiões comunistas».
Sim, é uma aldrabice, e esta, até, facilmente desmontável. A ideia do crescimento do Chega por via da quebra eleitoral da CDU não tem suporte, nem nos resultados eleitorais de 2024, nem nos resultados de 2025. Nos gráficos que acompanham o presente texto, apresento, para os distritos de Setúbal, Portalegre, Évora e Beja, as variações do número absoluto de votos que os principais partidos obtiverem (face às eleições anteriores) nas eleições legislativas de 2024 e de 2025 (ver gráficos 1-A, 2-A, 3-A, 4-A). (...)».