sábado, 28 de dezembro de 2013

UMA CRÓNICA QUE É UM BALANÇO | «Teresa Horta, o exemplo»


Disponível  online: aqui



P.S - já agora, insistamos: não há Secretaria de EStado da Cultura, mas sim uma área para a cultura na Presidência do Conselho de Ministros, e para isso, a nível do Governo, um Secretário de Estado da Cultura.

quinta-feira, 19 de dezembro de 2013

MUSEU NACIONAL DE ARTE ANTIGA | perseguições e insultos



A notícia da imagem vem na revista deste mês - dezembro de 2013 - do Sindicato dos Trabalhadores em Funções Públicas e Sociais do Sul e Regiões Autónomas. E num regime democrático é arrepiante, qualquer que seja o organismo onde isto se passe . Na circusntância, trata-se do MNAA  - Museu Nacional de Arte Antiga  - que institucionalmente está na esfera da Presidência do Conselho de Ministros, Área da Cultura, para a qual existe um Secretário de Estado da Cultura. E a este nível devem ser pedidas explicações.
Entretanto,  a questão parece ser mais grave: dizem-nos que situações semelhantes existem noutros serviços da cultura.  Aguardamos informações mais precisas e documentadas, e logo que as tenhamos aqui serão denunciadas. De facto, é preciso avisar toda a gente !
 
 
 
 
 
 
 

terça-feira, 17 de dezembro de 2013

PAÍS EM REGRESSÃO CIVILIZACIONAL E CULTURAL





Veja a notícia da imagem aqui, no Notícias ao Minuto, e a intervenção completa a que se refere neste endereço , no site do PCP, donde tirámos:

«(...)
Uma ofensiva destruidora que se alarga aos serviços públicos da área da cultura, a imposição de cega reestruturação das estruturas da administração central com o desmantelamento e desqualificação de serviços e sua crescente centralização, a que se soma a política de sistemático estrangulamento financeiro em todas as áreas da actividade cultural e que põe em causa a concretização do princípio de serviço público.
Os cortes brutais dos últimos Orçamentos do Estado, em cima do escassíssimo financiamento praticado agravam ainda mais a situação dos serviços públicos da área da Cultura.
Esta semana os sindicatos denunciavam a intenção do governo de levar a cabo um vasto processo de redução de trabalhadores na Direcção Geral do Património Cultural e nas Direcções Regionais da Cultura.
Trata-se, a concretizar-se tal pretensão, de mais um rude golpe para as áreas do Património Edificado, dos Museus, dos Sítios Arqueológicos e outros serviços onde a catástrofe é próxima. Já não bastava o financiamento miserável.
Depois de ter concentrado todos os serviços num só, o Governo aplica agora a “requalificação para o despedimento” a toda a estrutura. Foi uma operação de aglomeração para ser mais fácil destruir.
Este desmantelamento da Direcção Geral do Património Cultural e das Direcções Regionais da Cultura conjugados com as limitações impostas à Direcção Geral das Artes e ao ICA traduzem-se numa clara intenção de retirada total do Estado na preservação de património, na produção e criação artísticas e na promoção da elevação cultural e social das massas, o que também pode ser entendido como uma censura financeira às artes e à cultura. Suprimem-se as expressões culturais e artísticas livres e públicas, promovem-se as atordoantes e de mercado.
Foram publicados, há dias, pelo Eurobarómetro, os dados relativos à evolução da participação dos portugueses nas actividades culturais. E o que se vê é que estamos a andar para trás e a divergir com outros povos europeus. Estamos no fim da lista. Os portugueses são dos cidadãos da União Europeia com menores taxas de participação em actividades culturais e Portugal é o país onde há menor interesse pela leitura.
É este o rumo de uma política também de desastre cultural que está em curso. Uma política que não só destrói o que existe, como inviabiliza a criação do novo. Os teatros nacionais, o cinema, os muitos criadores contemporâneos e trabalhadores da cultura vêem a sua actividade cerceada e um Estado cada vez mais esvaziado e desresponsabilizado das suas funções constitucionais de defesa do nosso património e da nossa cultura como elemento fundamental da nossa identidade como povo.
Hoje, muitos criadores, trabalhadores da cultura, povo anónimo nas Jornadas do Manifesto em Defesa da Cultura saíram à rua em protesto contra este estado de coisas e pela exigência de 1% de financiamento do Orçamento do Estado para a Cultura. Luta que conta com o apoio activo e solidário do PCP!
É tempo de pôr fim a este rumo de desastre. Por isso a nossa luta pela demissão deste governo, pelo fim da sua política e pela exigência de eleições antecipadas.
Estes são os nossos combates de hoje. Combates que honram o legado de Álvaro Cunhal e a sua luta em defesa das Artes e da Cultura, do direito à identidade do seu povo e dos seus interesses, pelo desenvolvimento soberano do país».
 
 
 
 

segunda-feira, 16 de dezembro de 2013

PETER O'TOOLE |"Sonnet 18 - Shall I Compare Thee to a Summer's Day?" by William Shakespeare

 
Peter O'Toole morreu. A sua voz num soneto de Shakespeare :






 
Shall I compare thee to a summer's day?
Thou art more lovely and more temperate:
Rough winds do shake the darling buds of May,
And summer's lease hath all too short a date:
Sometime too hot the eye of heaven shines,
And often is his gold complexion dimm'd;
And every fair from fair sometime declines,
By chance, or nature's changing course, untrimm'd;
But thy eternal summer shall not fade,
Nor lose possession of that fair thou owest;
Nor shall Death brag thou wander'st in his shade,
When in eternal lines to time thou growest;
So long as men can breathe, or eyes can see,
So long lives this, and this gives life to thee.
  
Como hei de comparar-te a um dia de verão?
És muito mais amável e mais amena:
Os ventos sopram os doces botões de maio,
E o verão finda antes que possamos começá-lo:
Por vezes, o sol lança seus cálidos raios,
Ou esconde o rosto dourado sob a névoa;
E tudo que é belo um dia acaba,
Seja pelo acaso ou por sua natureza;
Mas teu eterno verão jamais se extingue,
Nem perde o frescor que só tu possuis;
Nem a Morte virá arrastar-te sob a sombra,
Quando os versos te elevarem à eternidade:
Enquanto a humanidade puder respirar e ver,
Viverá meu canto, e ele te fará viver 
 
 

sábado, 7 de dezembro de 2013

O CORPO DE DELITO | Vasco Pinto Leite


Comecemos por uma sinopse: "O testemunho de uma experiência que talvez nos ajude a perceber, pelo prisma cintilante da cultura, a génese dos caminhos políticos que seguimos e das teias que tecemos: uma revisita desde a acção cultural possível no final do anterior regime, prosseguindo pelo fluxo e o refluxo da Revolução de Abril, até aos labirintos da actualidade do estado da nação."
De seguida, uma entrevista dada pelo autor a propósito do livro ao JL, a 30 de outubro.
 
Por fim, é mesmo a não perder (se ainda encontrar o livro): uma memória pessoal que nos parece útil a todos os que se preocupam com a cultura e as artes. E aqueles anexos são fabulosos. Lá,   por exemplo, o projeto de lei do Teatro  a seguir ao 25 de Abril ( que eu tanto procurava no monte dos meus papeis) e que começa assim:  «O teatro passa a ser um serviço público ...), e logo a seguir: «É criado o Instituto Português de Teatro no Ministério da Comunicação Social, (onde, à data,  se encontrava a Secretaria de Estado da Cultura) que promoverá e coordenará a actividade teatral como serviço público». E sobre o reportório:

E diz o autor: «Nas atividades teatrais a primeira reunião teve lugar no Palácio Foz a 25 de Setembro de 1974, às portas dos acontecimentos do 28 de Setembro. Esta CCAT - Comissão Consultiva para as Actividades Teatrais viria a ter uma progressão bastante mais fluída que a do cinema». Apenas para se avaliar dos pormenores a que se chega no livro.

quarta-feira, 4 de dezembro de 2013

SECRETÁRIO DE ESTADO DA CULTURA | Da contabilidade que não fez





No rescaldo da sua ida ao Parlamento o Secretário de Estado da Cultura deu uma entrevista ao Jornal de Letras de 27 de novembro. Nos tempos que correm a dúvida assalta: dar ou não dar importância ao que é dito. Muitos dirão que já não vale a pena. Compreendemos, mas pensamos de forma diferente, há coisas que não se podem deixar passar «em branco». É o caso do que está no excerto da entrevista   na imagem acima. Deve fazer parte do novo paradigma para a cultura por parte da Administração: na circunstância,  talvez  nova  abordagem para «subsidiodependente».

Pois é, mas o Senhor Secretário de Estado da Cultura esqueceu-se de referir o outro lado da sua contabilidade ( e a  base é conhecida - DEVE | HAVER ), ou seja, de referir o que se fez com aquele dinheiro. E como é Secretário de Estado da Cultura até lhe ficava bem mencionar que fizeram milagres! Podia usar linguagem mais técnica, claro, e falar da forma como cada euro que recebem se multiplica, por exemplo, por via do gratuito, que amplia o financiamento recebido, e porque, em regra, sabem gerir muito bem as suas companhias. Com muitas pode mesmo aprender-se. As tais «boas práticas».

 Mas vamos à contabilidade, ao outro lado do deve e do haver, ao destino das verbas referidas pelo Senhor Secretário de Estado, ou seja, ao SERVIÇO PÚBLICO garantido pelas companhias apoiadas ao longo dos anos. Nada melhor do que ver exactamente o que foi feito. Uma amostra com as seguintes:
http://www.teatroaberto.com/repertorio.php http://www.cendrev.com/espectaculos_historia.php



http://www.abarraca.com/index.php?option=com_barraca&view=ecos&Itemid=7
http://www.seivatrupe.pt/frames.htmlhttp://demo.tecascais.org/wordpress/?page_id=299http://www.teatro-da-rainha.com/REPORTORIO/reportorio-10-14.html#top
 
 
Para saber do Histotial  destas Companhias é só clicar: Cornucópia.Teatro Aberto ; CENDREV ;  A BARRACA ; TEC ; CTAlmada (arquivo);  Seiva Trupe ; Teatro da Rainha.
 
Que nos perdoem as restantes companhias por não fazermos aqui um link para a sua história, mas como ilustração pensamos que é suficinete.  A propósito, é óbvio que, em permanência, a DGARTES deveria proporcionar esta  informação. E houve projetos que o visavam. Que é feito deles ?  
Entretanto, faz sentido que se lembre como noutros tempos se olhou para as companhias mais antigas:
 
 
 
 
 
 
 


sexta-feira, 29 de novembro de 2013

TEATRO MUNICIPAL DA GUARDA



TEATRO MUNICIPAL DA GUARDA (TMG)

A não renovação de contrato do Director Artístico deste Teatro, Américo Rodrigues, equivale a um despedimento. Sublinho Director Artístico porque creio que o busílis aí reside. Quando há dimensão artística no delinear dos programas estes não são só na óptica do consumo, dos públicos-alvo (que expressão imbecil) e todos sabemos que teremos de atrair por criar algo próprio e não por andar sempre a comer de fora aquilo que muitas vezes lá fora é mais que requentado – requentado e não requintado. Conheço o trabalho do Américo porque desde muito antes da existência do edifício do TMG, na Guarda, lá íamos apresentando os espectáculos criados em Évora e nas Caldas – CCE, CENDREV e depois Teratro da Rainha (desde 1975). Nessa altura o Capitalismo Cultural era inexistente, as estruturas de criação casos isolados num mapa nacional que continuava um deserto cultural e na guarda um núcleo de animação já fazia os seus programas entre a criação teatral e uma programação para as condições precárias de então. Todos sabemos que a tese de um desenvolvimento cultural, e fundamentalmente artístico, assente no isolamento de cada ilha de um arquipélago inexistente, não colhe frutos no prazo que geraria um futuro mais laico e rico de possibilidades para todos e cada um, era necessário articular convergências – tudo isto antes da Europa. A sociedade a construir deveria obviamente ser aquela que as lições da história contém, não só evitando o regresso de totalitarismos reconhecíveis na essência, embora plenos agora de marketing político e comércio de imagem diariamente renascida, como oferecendo condições de dignidade a todos os cidadãos, os que vivem no centro do centro da capital e tendencialmente idênticas para os que vivem no centro do centro da periferia mais afastada. Era isso que se tentava nessas primeiras periferias. A globalização ainda era uma criança na actual forma internética.

E na Guarda apresentámos muitas vezes, antes do edifício TMG, espectáculos no Jardim público, no auditório rudimentar da autarquia, sempre aquele problema do pé-direito. E com o pé esquerdo entrou o Américo na concepção e invenção cuidados do edifício TMG, desde a primeira hora. A ele, e certamente a outros, se deve a existência do colosso cultural, do objecto arquitectónico esplêndido. Já lá estive em cena três vezes e sei do que falo. O TMG era um objecto particular com uma programação particular. Na realidade o Director Artístico, desde a primeira hora, ao imaginar o edifício e falar com o arquitecto, imaginou um modo de habitá-lo, o que é raro. A maior parte dos teatros desta geração última, de sofisticada arquitectura exterior/interior e tecnologias da cena, foram construídos sem modelo de actividade futura, sem sujeito prospectivo e inquilino criativo previsto – os dinheiros comandaram. Foram a avalancha de dinheiros europeus que os inventou. Na maior parte dos casos imagina-se que um director, um “controleiro”, um homem de mão do autarca, serve as vezes de um inventor de vida cultural própria – criar vida artística, políticas de gosto, numa cidade, não é o mesmo que escolher de tudo um pouco e passar por diverso, na tal oferta, isso é mais próprio da lógica do Natal e mete chocolates. As programações destes edifícios, de serviço público inscrito no código genético, oscilam entre a sociedade recreativa, o Lago dos Cisnes, o “dernier cri” performativo, uns filmes escolhidos por um tipo amigo da capital, uns jazzes mornos quase à beira do espírito Martini e uns êxitos televisivos transpostos para a terrinha – coisa que um qualquer consumidor menos que médio de “cultura” consegue somar. Nalguns casos a coisa é mesmo obscena, o mais revisteiro e de mau gosto imaginável, tipo “Estacionâncios e punhetaços”, do género, com a sigla TVI ou congénere. Sem dimensão mediática, maior ou menor, nada existe aliás, o direito de cidade, artístico, não é especificamente artístico, é antes mediático. Não se trata das obras, trata-se da visibilidade do embrulho e da celebridade dos protagonismos, como dizem, dos protagonismos principais – ora aí estamos.

O Américo desde o princípio que imaginou diferente, com independência e sem cedências populistas. Com cosmopolitismo ligou-se à rede de teatros de Leão e Castela e com faro para a dimensão popular da cultura local promoveu realizações com as populações, envolvendo-as na experiência artística. Além disso desenvolveu o ProJéctil, para a realização de criações residentes e foi fazendo uma programação acertada entre um certo desejo de aceder ao que nos grandes centros se produzia, em razão de escala e diversidade e uma forte componente de realizações local, tudo feito numa auscultação cuidada da cidade. O problema destes edifícios não é a programação, o que qualquer um faz numa lógica acumuladora, é somar coisas e dar-lhe um nome com vocação publicitária – longe obviamente do talento de O’Neil, esse era poeta. O problema é a dinâmica entre a dimensão criativa residente e os acolhimentos estratégicos, o diálogo do dentro com o fora e com o dentro. Quando não há dentro nada a fazer, é como um corpo sem desejo nem ideias, surfando o clima do que dá: a inércia tem grandes virtudes e muitos começam logo cadáveres a procriar, nada mais fácil que estar morto numa vida que não sofre mudanças positivas e regride - agora como finalidade. O Américo é de facto um artista, um poeta apaixonado pela experiência da poesia sonora e por um certo jogo plástico com a palavra, escreve, faz sons, é homem de teatro, criou o Aquilo, a raiz do movimento cultural actual na Guarda. É de facto um artista enquanto Director. Não é, nem foi, um homem de mão do autarca. Este é o problema. O actual Presidente sabe bem como apetece - todos sabem, é mesmo o que sabem sobre estas matérias - em termos eleitorais futuros e de promoção constante do feito autárquico, um edifício deste tipo. Ora não lhe convinha que lá estivesse um artista, certamente escolherá um comissário programador.

Fernando Mora Ramos

«FORUM D'AVIGNON» | Cultura é futuro

 
 
 
 

Forum d'Avignon: veja o que se passou entre 20 e 23 de novembro e, em especial,  os estudos elaborados a propósito da edição deste ano  e o manifesto 2013.


quinta-feira, 28 de novembro de 2013

JORGE SILVA MELO | O comentário que é um programa




Américo Rodrigues foi afastado da direção do Teatro Municipal da Guarda e isso foi notícia na comunicação social. O jornal Público escreveu um artigo que está online:  Américo Rodrigues afastado da direcção do Teatro Municipal da Guarda - O novo presidente da Câmara da Guarda, Álvaro Amaro, não gostou que Américo Rodrigues convocasse uma conferência de imprensa para o contradizer e já o tinha tentado despedir pelo telefone.  Da notícia  na edição impressa, tirámos o excerto que está na imagem acima. E queremos sublinhar - aparentemente parece lateral, a nosso ver é essencial -  o que foi dito por Jorge Silva Melo
«"a questão central é a de saber quem manda nas infra- estruturas construídas com dinheiro do Estado" e defende que estas não podem ser "anunciadas por ministros e secretários de Estado para depois serem entregues às autarquias como se fossem salões de festas"». 
Sendo-se rápido e direto, a questão nuclear é saber o que é feito da «REDE DE TEATROS» (está entre aspas, sim senhor) em que se vem a investir ao longo de décadas, acelerada com os fundos comunitários, e que enquanto rede nacional - com um Projeto Artístico organizador -  nunca aconteceu.E tem de acontecer. Certo,  num ou noutro caso chegou a caminhar-se para lá.  E daí que digamos que o comentário de Jorge Silva Melo nos conduz a um Programa que devia estar contemplado nas Grandes Opções na esfera da cultura e das artes e, necessariamente,  no Orçamento de Estado. E a REDE só pode ser construída de forma partilhada e colaborativa entre o Central e o Local, como todos estamos fartos de saber. E com os agentes culturais no centro: sem projeto artístico para que servem as infraestruturas físicas?  E tudo de maneira transparente. 
Em jeito de memória, lembre-se o tão divulgado aquando do POC - Programa Operacional da Cultura: 


Do prospeto sobre a REDE anunciada em 1999

E indo-se aos documentos da época, é bem visível que tudo só seria possível com uma mobilização ampla - Estado Central, Autarquias, Mecenas. Com os Agentes Culturais, obrigatoriamente. As articulações necessárias podem ser ilustradas pelos presentes na cerimónia, de 27 de Março de 1999, em que se anunciou a «REDE». Foram oradores:  «Dr. Mário de Almeida, Presidente da Associação de Municípios, Dr. José Augusta Carvalho, Secretário de Estado da Administração Local, Prof. Doutor Manuel Maria Carrilho, Ministro da Cultura, e Engº. António Guterres, Primeiro Ministro». E cá encontramos os Ministros e os Secretários de Estado de que fala Silva Melo. No passado como no presente.
Daí para cá, como é que tudo foi acontecendo até chegarmos onde estamos? Como se articulam os Apoios às Artes com tudo isto? Muitas perguntas, e enquanto não forem respondidas  não chegaremos a bom porto.  Em termos de legislação, salvo melhor leitura, o Despacho Normativo 46/96,  revogado em 1998,  nunca foi substituído  por algo equivalente.
Estamos no início de um novo Programa Comunitário, manda o bom senso que se pare e se equacione, se façam balanços. E onde estão eles! Para não repetirmos os erros e sabermos para onde vamos.   E até para se ir ao encontro de, por exemplo,  o Ministro Poiares Maduro disse em discurso recente«Tão importante como fazer, será levar outros a fazer», referiu o Ministro, pois «uma competitividade sustentada terá sempre de passar pela associação entre conhecimento e território». E nos «outros», na cultura e nas artes, certamente que estarão os Agentes Culturais, ou não será! Como colocá-los no centro da REDE, das REDES, com a miséria dos apoios que lhes chegam do Estado? E que conhecimento será esse com a cultura e as artes a serem tratadas desta maneira escandalosa! Sem visão, sem futuro ! Não bastam palavras, temos de agir em conformidade. 



quarta-feira, 20 de novembro de 2013

OE 2014 | CULTURA | A banalidade da desgraça | AUDIÇÃO do Secretário de Estado da Cultura no PARLAMENTO



Imagens da audição

No dia 7 de novembro, o Secretário de Estado da Cultura esteve em audição na Assembleia da República no âmbito da discussão da proposta do Orçamento de Estado para 2014. Durou 4 horas, e está registada em video a que se pode aceder aqui no site da Assembleia da República. O Elitário Para Todos já o visionou, e é na sequência disso que regista o seguinte:

«Secretaria de Estado da Cultura» - Não deixa de ser sintomático,   no Parlamento não há forma de se interiorizar que não há Ministério da Cultura e que também não há Secretaria de Estado da Cultura. Concluímos isso mesmo ao ler-se   no site da Assembleia da República «Nota explicativa da Secretaria de Estado da Cultura», e logo nos  primeiros minutos do video acima referido. Informemos: como muitos dizem, o que existe é uma "COISA" na Presidência do Conselho de Ministros. Sejamos rigorosos, de acordo com o diploma orgânico, a «coisa» designa-se «área da cultura».

E a audição realizou-se - Tal como a generalidade dos cidadãos, os senhores deputados não conseguem perceber os documentos que integram a Proposta de Orçamento no que diz respeito à cultura. É tão confuso que não conseguem fazer contas. E a Nota Explicativa enviada pelo  Secretario de Estado da Cultura, a que pode também aceder aqui , segundo os deputados da oposição não explica nada. Parece que ficou acordado que vai ser enviada nova nota explicativa e mais uns mapas que também faltavam. Acresce mencionar que o Secretário de Estado da Cultura disse que por vezes também tem dificuldades na leitura dos documentos do orçamento. Bem recorreu ao telefone, o senhor Secretário de Estado,  mas, ainda assim, há coisas que não foram esclarecidas. É de perguntar,  o que fazem os seus adjuntos e assessores? Como pode verificar, a confusão foi de tal ordem, a falta de informação e de clareza são tão evidentes, que há momento em que quem vê o video julga que a audição vai ser adiada. Mas não, foi até ao fim ... Ou seja, o OE em geral não prima pela transparência, mas exagera-se no que diz respeito à CULTURA. A situação devia ser proibida. Não é admissível que qualquer interessado não saiba de forma clara como é que a Cultura está equacionada no Orçamento de Estado. E isto deve ser denunciado !

1% para a Cultura -   Em determinado momento, o Secretário de Estado da Cultura dirigindo-se a uma deputada da oposição disse que ela não sabia do que estava a falar: «se soubesse não me tinha feito essa pergunta», adiantou. ( Como se vê, muito elegante!). Mas talvez se possa utilizar estas suas palavras para se comentar o que diz e disse a propósito da percentagem do OE e do PIB para a Cultura. Não vamos admitir que pura e simplesmente queira ofender a nossa inteligência. Senhor Secretário de Estado,  percentagem é percentagem, para o muito e para o pouco. Todavia, os mesmos % nos cortes não tem o mesmo efeito em orçamento elevados e em orçamentos reduzidos. Como a Cultura já estava no «osso», para se utilizar termo aparecido no debate, o efeito é devastador.  E por isso não vale a pena  recorrer à crise para justificar a sua diminuição. Estamos, como informou, "sem pestanejar", nos mero "0,2%"! Há mínimos abaixo dos quais não se pode descer, sob pena de estarmos até  a desbaratar  esse mesmo dinheiro. E é o que está a acontecer. Isto é, não se podem fazer cortes «cegos» no orçamento. Mas, pelos vistos, o Secretário de Estado da Cultura, que devia ser o primeiro a reconhecer isso e a mover todos os esforços para alterar esse estado de coisas, está na primeira fila a aceitar a situação. Assim sendo, pensando bem, nem se precisa de SEC. Aliás, parece ser a crise que o levou a aceitar o cargo no Governo, o que parecia entrar em contradição com o seu passado: diz ou alguém disse que foi uma diminuição de verbas que  o levou a deixar, à data,  o cargo de de Diretor Geral das Artes. E hoje as verbas equivalentes são objetivamente muito e muito mais baixas.  Mas afirma o senhor Secretário de Estado que são situações diferentes: no passado havia contratos assinados, agora há crise.  Quem sabe, isto não será assim tão ingénuo e descabido: é que a crise e os "0.2%" terão "as costas largas" para o que quer que seja feito ou não na Cultura. De facto, estas situações  são preciosas para um tipo de governação: as coisas são o que são,  não podiam ser doutra forma, até lamentam, mas a culpa não é deles. É a cantilena de não haver alternativa. E, se algo correr bem eles estiveram lá, e tudo o que correu mal foi devido a outros, no limite à crise, à troika.
E nesta atmosfera, percebe-se  que o Senhor Secretário de Estado, pelo sim pelo não, também não queira ficar totalmente fora dos que reivindicam 1% para Cultura, e foi assim que até nem reagiu mal aos que se manifestaram nas galerias a pedir isso mesmo. Veja o video aqui. Mas diz para não alimentarmos certas ilusões, mas que é bom termos ilusões, e lutarmos por elas. Como se vê dá para tudo. Mas lá foi mantendo a arenga de que em tempo de crise é utópico pedir 1% para a cultura. Olhe que não, olhe que não ... É sábio! e deve ser visto como um percurso, um processo ... Doutra forma não sairemos nem desta nem de outras crises.   

«Coisas» - O Secretário de Estado da Cultura, fala, fala, fala ... e diz «coisas». Que já foram prometidas no passado, nomeadamente no OE para 2013, mas disso não presta contas. O eterno retorno. E diz sem risco, com palavras que já nem significam nada de tão banalizadas que estão. Estruturante aparece com frequência, e anuncia-se milagre: não há recursos mas vai-se consolidar e desenvolver. E de nada vale lembrar as companhias que estão na iminência de fechar!  Outra: quem é que vai ser contra estudos a realizar por universidades? então vamos nessa. 10 estudos duma assentada, de que não se fica a saber praticamente nada. Decorrem de que diagnóstico? Vão precisar de que dados e informação dos serviços ? Serão balanços da utilização dos fundos comunitários para a cultura passados e presentes ? Nada se fica a saber.  Há nomes que valem por si: insista-se, pois, no «part-time» de Pinamonti no São Carlos. Poupa-se diz o Secretário de Estado.A Cinemateca não tem dinheiro !, calma, vai continuar a beneficiar do Fundo de Fomento Cultural, que desta feita parece que se tornou num «tapa buracos»,  na medida do possível, adiantará o Senhor Secretário de Estado da Cultura. Quanto vai haver para os apoios às artes? o Secretário de Estado da Cultura assegura que vai honrar os compromissos do que já está contratualizado, como se fosse um grande feito. Para os apoios pontuais e anuais, não percebemos o dinheiro que está na proposta do OE. Mas, certamente,  como ainda não há compromisso,  o senhor Secretário de Estado não se demitirá qualquer que seja a verba.   E o resto é todo ele neste tom ... Tomem lá contas satélite, alteração ao mecenato, pegada cultural, internacionalização,  alterações no depósito legal de que não se percebeu a razão, Balcões e plataformas ( o que será feito do Portal da Cultura, e da Plataforma do Território Artes, e a outra da Gestão Electrónica de Apoios ?),  e tudo o mais que perguntarem ... . «Coisas»,  sem se perceber para que destino cultural.    

«Não fechou» - Há momentos definidores. Aquele em que uma deputada da maioria que apoia o Governo proclamou que afinal as coisas não estavam tão mal como a oposição queria mostrar - como viam, andavam a dizer que a Cinemateca ia fechar, e não fechou -  é um deles. Talvez sumarize o que marcou as intervenções do PSD e do CDS. Pelo respeito que os eleitos nos devem merecer mais não diremos sobre as intervenções dos deputados da maioria que apoia o Governo. Não precisa de ver as 4 horas do video, mas passe por lá,  e rapidamente verá onde chegámos. E são jovens muitos deles, talvez a maior parte. 


Secretário de Estado de si  mesmo - A situação institucional da cultura na orgânica do governo, o miserável orçamento que é dedicado à cultura, a maneira como o SEC chama a si e afasta de si os assuntos - diz que o CENDREV e a SEIVA TRUPE  são determinantes mas se estão em dificuldades a culpa é do júri e ele não se vai meter no seu trabalho  ... -  facilmente nos remetem para a imagem Secretário de Estado de si mesmo. Cuidado, quem sabe, à semelhança do São Carlos, não virá ainda a ser substituído por um outro SEC,  em part-time. É que a moda pode pegar, tal é o entusiasmo que o SEC põe na solução ...


Os deputados não são todos iguais - É bem visível o que separa a esquerda e a direita através desta audição: o serviço público na cultura e nas artes. A direita não o quer. «De ouvido» ou por convicção querem deixar a cultura e as artes ao mercado. E falam em formação de públicos como se isso não fosse o resultado natural do serviço público - continuado, permanente, sistemático. Os deputados não são todos iguais, o video seguinte mostra o que foi dito pelos do Grupo Parlamentar do PCP, e através dele ficamos a saber onde estamos metidos.






Conselho das Finanças Públicas - «O Conselho das Finanças Públicas tem como missão proceder a uma avaliação independente sobre a coerência, o cumprimento dos objetivos definidos e a sustentabilidade das finanças públicas, simultaneamente promovendo a sua transparência». Drª. Teodora Cardoso, nem precisa de levar a matéria a uma das suas «Sextas da Reforma», detenha-se nesta audição havida no Parlamento,  e intervenha nas finanças da cultura e das artes. Com carácter de urgência. Os que se nos seguem, as tão badaladas gerações futuras,  irão perguntar onde estávamos todos nós, aqui e agora.







terça-feira, 19 de novembro de 2013

OUTRO ESCLARECIMENTO DA COMPANHIA DE TEATRO «A BARRACA».




Antes, já nos tínhamos referido à posição da A BARRACA face aos resultados dos concursos de apoioS às artes através da DGARTES, neste post,  mas a Companhia volta a reagir perante o que foi dito pelos responsáveis pela cultura no Governo, e é sobre isso o comunicado abaixo. 


                                 


A   Secretaria de Estado da Cultura defende que o actual modelo de apoios   financeiros às entidades artísticas “é sinónimo de transparência e   equidade”

É   altura de A Barraca dizer alguma coisa sobre o que se está a passar


A   Barraca desde há  anos orienta artisticamente um curso profissional de   teatro integrado numa IPSS – o Instituto de Desenvolvimento Social apoiado   pelo Ministério de Educação – que já pôs alunos na actividade profissional ,   preparando-se outros para seguir cursos superiores;     A   Barraca contou ao longo dos  últimos anos com 50.000    espectadores/estudantes da peça “Felizmente há luar” que integra o   programa do 12º   ano; tem levado  regularmente a efeito workshops de iniciação   teatral onde jovens complementam a sua   educação; tem transformado jovens estagiários em profissionais competentes e de   brilhantes carreiras,  no   entanto A Barraca no modelo de apoios financeiros às entidades artísticas que   o actual Secretário de Estado defende  como “sinónimo de transparência e   equidade” merece um 0 na alínea que se refere a sistema   educativo.  Ocorre que esta mesma companhia estimula desde há 37 anos a   aprendizagem e o gosto pela história e a literatura,levando ainda este ano a   cena uma obra do Professor Nascimento Rosa que incide sobre o pouco estudado   Pessoa jovem, outra sobre a vida,o reinado e a loucura de Dona Maria I da   autoria do Professor Brasileiro António Cunha. Além disto a Barraca tem   correspondido  a convites do sector educativo da Fundação Calouste   Gulbenkian, realizando apreciados espectáculos sobre figuras da História e da   Ciência ,querendo isto dizer que o trabalho da Companhia  que enriquece   e apoia e é escolhido pelo sector educativo da Gulbenkian e  pelos   professores do país inteiro,  não é reconhecido pelo “transparente e   equitativo”  critério dos funcionários que servem a SEC.

Além   disto  “o modelo de apoio que é sinónomo de transparência e equidade”   não reconhece o que todo o país conhece.Ou seja, o enorme trabalho desta   companhia em levar há décadas o seu teatro a todos os pontos do país de forma   regular. E atribui também zero ao “ exercicio de actividade fora de Lisboa”.    Na verdade actualmente as instituições fazem por impedir o transito das   estruturas de criação que não  querem pertencer aos lobbies nada   transparentes nem equitativos que puseram em funcionamento.Mas atenção então   terão que definir para que todos saibamos  o que significa  no   actual regime a expressão “fora de Lisboa”. Depois com itens assim avaliados   pode classificar-se em 31º lugar num ranking de 54  estruturas   apoiadas  uma companhia prestigiada no país e no estrangeiro apenas para   tornar justo e transparente o roubo que se lhes faz. A Barraca é a 31ª   Companhia do País.Podem-me dizer assim de repente quais são as 30 melhores?A   trama está bem montada temos de reconhecê-lo,não tivesse custado ao estado   português um incalculável gasto em aconselhamento jurídico. 




sábado, 16 de novembro de 2013

Pela Preservação das Coleções e Património do Instituto de Investigação Científica Tropical (IICT)



Uma forma de nos associarmos ao apelo do ICOM  International Council of Museums / Portugal sobre a Preservação das Coleções e Património do Instituto de Investigação Científica Tropical (IICT), Lisboa, passará  pela divulgação do Comunicado  sobre o assunto. Aqui fica:
 

Pela Preservação das Coleções e Património
do Instituto de Investigação Científica Tropical (IICT), Lisboa
COMUNICADO
Face às notícias vindas a público esta semana, a Comissão Nacional Portuguesa do ICOM expressa a sua mais profunda preocupação e consternação sobre o enorme corte orçamental previsto para o Instituto de Investigação Científica e Tropical (IICT) em 2014. A confirmar-se, este corte coloca direta e imediatamente em risco as coleções, arquivos e património do IICT ao nível da sua preservação, integridade e recursos humanos afectos.
 
Com origem na Comissão de Cartografia Portuguesa de 1883 e resultantes da investigação efectuada no âmbito das missões ultramarinas, em diferentes áreas disciplinares, nos séculos XIX e XX, as coleções do IICT incluem arquivos – sobretudo o Arquivo Histórico Ultramarino (c. 16 km de documentação e 730.000 fotografias) – coleções de referência biológicas, geológicas e de solos (520 mil espécimes), coleções arqueológicas e etnográficas (142 mil artefactos), coleções de mapas e cartas (210 mil exemplares), bem como bibliotecas e coleções de equipamento histórico-científico.
Além do seu incontestável valor científico, as coleções do IICT materializam de forma evidente a identidade e diversidade cultural das sociedades do espaço de influência lusófona, contribuindo para o conhecimento das relações entre a Europa, África, América do Sul e Ásia, do Atlântico ao Pacífico. Para além disso, constituem um instrumento de enorme valor económico e ambiental, fundamental para uma correta gestão de recursos naturais no quadro das políticas de cooperação e desenvolvimento. Em particular, as coleções biológicas do IICT são as maiores do mundo na representatividade da fauna e flora dos Países Africanos de Língua Oficial Portuguesa (PALOP), documentando o ambiente terrestre, passado e presente, destas regiões, contendo informação primária sobre biodiversidade e permitindo a investigação sobre temas essenciais da contemporaneidade, como as alterações climáticas com impacto nos ecossistemas e o desenvolvimento sustentável. Continue a ler.


 

domingo, 10 de novembro de 2013

«RESISTÊNCIA»


Em publicação prévia:



RESISTÊNCIA

A palavra sempre contém a eternidade possível. A vida, como sabemos, tem entretanto um tempo limitado e dizer sempre, até sempre, para sempre, é explicitar um desejo impossível de superação do tempo que, contra todas as evidências, não deixamos de afirmar, expressando esse impossível – que gesto mais revolucionário que esse de tentar materializar o espectro que nos ronda, e rondará, potencialidade de sociedade comunista sempre, fantasma a converter em sociedade de carne e osso, sociedade do poder administrador do que é comum entre iguais diferentes contra a ideia do cada um por si, da esfera do privado como um horizonte, do lucro do capitalista e da expropriação privada do que é de todos, sociedade da justiça contra as teias burocrático-legais do jurídico que regra a desigualdade estruturante?
Permanecer, nesse tempo que nos calhou viver, ligado sempre a uma ideia nova, a ideia comunista, assinalados necessariamente hoje os seus desaires e monstruosidades – na Coreia do Norte o exemplo vivo da aberração dinástica, no desprezo do que seja essa comunidade sem classes por vir – para que o seu valor se reerga como impossibilidade possível, de novo, e combater por ela em todos os tempos que a história foi gerando e em todas as frentes, é admirável.
Dizia Brecht que há muitos tipos de homens resistentes, mas que os imprescindíveis sempre eram raros por não desistirem, por resistirem sempre. Eram, por isso mesmo, imprescindíveis. Voltavam sempre ao “motivo do crime” para nele semearem, insistentemente e sob forma nova no tempo refeita, o seu modo de ver, a sua visão e isso para além dos limites físicos, como sabemos, pela história do chamado “segredo”, essa tortura do isolamento total, de uma separação total do mundo dos vivos, experiência tumular e pela extraordinária fuga da prisão/forte de Peniche.
Não sou dado a mitificações e o Álvaro Cunhal combatia, como sabemos, o culto da personalidade e exercitava uma reserva solidária no estilo, era alguém que se dizia revolucionário profissional e evitava entretenimentos fabulares em torno da vida pessoal, o que, em boa verdade, espicaçou em muitos o desejo contrário. Era um homem invulgar, uma figura absoluta de resistência, de insistência determinada no combate e consistência nas razões e visões desse combate. Estive perto dele algumas vezes, numa reunião, acerca das possibilidades do teatro no Alentejo, ali por 75, reunião em que ele anotou num caderninho escolar o que íamos dizendo acerca dos preconceitos que existiam, na Lisboa centralista, relativamente ao lançamento de uma actividade artística numa região deserta de cultura artística. E lembro-me da primeira digressão alentejana por terras da Reforma Agrária. Um aperto de mão inacreditável de firmeza e uma mão ampla. Detalhes, mas no detalhe está também um sinal do conjunto dos comportamentos. E o que mais me seduz, nessa viagem agora em direcção ao passado com os olhos virados para a frente – e nunca o capitalismo esteve tão agressivo e radicalizado na sua vocação antidemocrática e anti-liberdades, anti-humana e anti-comunitária, de 45 para cá, capaz de sujeitar a humanidade a um apocalipse - é pensar a diversidade das formas dessa resistência: a tese de licenciatura sobre o aborto, os ensaios sobre a estética, a tradução do Rei Lear, o livrinho sobre as lutas de classes na idade média, o interessante “radicalismo pequeno-burguês de fachada socialista”, a questão agrária, os magníficos desenhos, etc. Essa diversidade, mantida na sua coerência interna uma unidade de pensamento aberta à possibilidade de um novo não pré feito, é algo de facto único. Poucos dirigentes foram assim feitos de tanto vário e de, nessa multiplicidade de interesses, plasmarem o ser - talvez Gramsci, estranhamente pouco amado para além de Itália, seja adequado referir aqui. Essa multiplicidade constitutiva da acção e interesses é um sinal que muitos deveriam seguir, atentos. A vida não é o caminho estreito de um combate feito nos carris de uma contrarresposta mecânica, a vida é a multiplicidade das formas da sua existência e não devemos apequená-la, o combate é múltiplo e muito mais complexo que a sua redução a uma agenda contraposta da do inimigo. Hoje é muito óbvio que a resposta taco a taco, no plano da arena mediática, é um empobrecimento e uma redução do universo da política ao próximo clichê possível.  
Esta é a minha herança de Álvaro Cunhal, uma herança assente numa multiplicidade também dos contextos da práxis política, desde os tempos do Socorro Vermelho aos de ministro de Estado sem pasta nos primeiro Governos pós Abril, mas cuja determinante é justamente a da riqueza da diversidade dos contributos, com uma grande incidência nas práticas artísticas que, insisto, não devem ser entendidas como coisa secundária, nem apenas como algo próprio de alguém excepcional, mas como horizonte prático de todos nesse comum por vir que se deve gerar todos os dias numa óptica real de mudança.
O que explica o interesse pelo Rei Lear, uma tragédia sobre a problemática da herança – questão central e ligada à lógica essencial e vital da continuidade do projecto de vida em simbiose com o projecto ideal- em que, Cordélia, a herdeira mais dedicada, é posta de lado por lhe faltar o “teatro de afectos” suficiente para enganar o Rei, como fazem as duas irmãs mais velhas? 
Imagino quanto não terá sido difícil, muitas vezes, ver largo no apertado caminho possível de uma luta de classes conduzida no espaço restrito da clandestinidade, esse espaço sem liberdade e sem, por assim dizer, possibilidade de informação abrangente e referencial livres, e gosto de pensar nessa extraordinária forma de resistência que é a escrita, o estudo e até um invulgar trabalho de tradução de Shakespeare num universo prisional. É de facto uma capacidade limite e uma atenção à especificidade do que é a arte como característica essencial do humano.
Álvaro Cunhal terá dito a Petrova, filha de um dirigente soviético, acerca da experiência prisional: “Isolado, separado dos seus camaradas, o homem não sabe se conseguirá ainda alguma vez na vida sair à rua, sentar-se num banco, recostar a cabeça, olhar o céu enorme.” Nada mais claro que esta confissão de fragilidade, só um grande resistente a faria.  


 

sexta-feira, 8 de novembro de 2013

«Um Dó Li Tá»


Um Dó Li Tá
António Lobo Antunes


"Perguntam-me muitas vezes por que motivo nunca falo do governo nestas crónicas e a pergunta surpreende-me sempre. Qual governo? É que não existe governo nenhum. Existe um bando de meninos, a quem os pais vestiram casaco como para um baptizado ou um casamento. Claro que as crianças lhes acrescentaram um pin na lapela, porque é giro». Continue a ler.