sexta-feira, 14 de novembro de 2025

«ELOGIO DO RISO» | além do que se vê em palco a não perder o número dos «Textos de Almada» que lhe é dedicado| E AGORA TEMOS TAMBÉM O TEXTO DE DOMINGOS LOBO QUE PODIA SER ACRESCENTADO AOS EXISTENTES | E COMO NÃO REPARAR NO QUE JOÃO CARNEIRO NOS DIZ? - «O RISO, COMO O TEATRO, É UMA COISA QUE SE ENSINA E QUE SE APRENDE»

 

 
e de lá a nosso ver esta «pérola»
«Uma forma de  liberdade»
Herman José 
 

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 Entretanto, neste tempo em que não 
abundam CRÍTICOS/AS DE TEATRO, 
ler DOMINGOS LOBO 
no AVANTE! é um privilégio
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«(...) É neste ce­nário, entre o aus­tero e a su­gestão do es­boço de uma nar­ra­tiva em cons­trução, que a fi­gura frágil de al­guém que cuida desse lugar, surge para ocupar esse es­paço, para o ha­bitar e tornar seu. O andar in­se­guro, as roupas an­dra­josas do tra­balho, a lan­terna que per­corre ner­vosa os re­cantos da grande nave, o can­saço da ro­tina. E a ac­triz, ao caso essa ta­len­to­sís­sima ac­triz que é Maria Rueff, na quase au­sência de pa­la­vras deste seu fiel de ar­mazém, es­ti­vesse ali, a en­cher o palco, para nos mos­trar que na dor, na quase au­sência de todos os con­fortos que o ne­o­li­be­ra­lismo trom­be­teia, o riso e as can­ções apren­didas na in­fância ainda são pos­sí­veis, que al­gumas pa­la­vras bastam, mesmo que ata­ba­lho­adas, en­con­tradas ao acaso num di­ci­o­nário de bolso, al­guns gestos, para co­mu­nicar com o outro, mesmo que as pa­la­vras, dessa voz ames­trada, sejam inin­te­li­gí­veis.
A per­so­nagem de Rueff é a de um ser so­li­tário, vi­vendo nas tra­seiras de um uni­verso de fic­ções, longe dos olhares e dos aplausos do pú­blico, des­per­tando dessa ta­refa so­li­tária e re­pe­ti­tiva com a che­gada de «uma “com­pa­nhia de in­gleses”, es­pe­ci­a­lista em Sha­kes­peare, que vem montar o Hamlet a Al­mada». É um ser que vive as mar­gens do sonho, sem dele fazer parte, al­guém em­pá­tico, de quem se gosta ao pri­meiro gesto, pela fra­gi­li­dade, pelo andar do­brado, por pe­quenas frases ditas, para si, quase em sur­dina. E logo nos vêm à me­mória o Charlot de Luzes da Ci­dade, Tempos Mo­dernos, A Qui­mera do Ouro, Buster Ke­aton, ou o olhar me­lan­có­lico de Totó, ou o drama es­con­dido por de­trás da agu­dís­sima voz do bo­ne­creiro da peça O Va­ga­bundo das Mãos de Ouro, de Romeu Cor­reia. Essa dor, dizem-nos Rueff e Ro­drigo Fran­cisco, que en­con­traram no texto O Con­tador, de Aldo Pa­laz­zeschi, que ambos es­ca­varam para des­co­brir o riso que toda a dor trans­por­tará.
Essa dor/​riso ma­ni­festa-se em vá­rias si­tu­a­ções de Elogio do Riso: na forma como o con­tínuo/​por­teiro/​fiel de ar­mazém di­a­loga con­sigo, à falta de in­ter­lo­cu­tores, ou com as vozes, numa es­tranha língua, que vêm da régie; na cena da re­feição, nesse tu­gúrio sim­bo­li­ca­mente es­ca­vado num dos al­ça­pões do palco, em que re­vemos Charlot; nos ape­tre­chos usados para aparar os pingos de chuva, que se trans­mudam em ins­tru­mentos mu­si­cais numa das cenas mais có­micas e con­se­guidas da peça, na qual me­lhor re­co­nhe­cemos a grande ac­triz de co­média que Rueff é; a su­bida das es­cadas, para ilu­minar a imagem do nicho, a perna que ba­loiça no vazio é um achado, como o é o de­leite como a per­so­nagem se es­poja no trono de Hamlet, des­truindo o seu régio sig­ni­fi­cado. 
A cena da tem­pes­tade, os tro­vões, o vento, o ruído da chuva, é uma das cenas de grande im­pacto, aqui, graças à tec­no­logia e à apro­pri­ação que dela fez Da­niele Men­drico. Os pa­péis que o vento es­palha pelo palco serão do Hamlet, ou das que este es­pec­tá­culo poupou, subs­ti­tuindo-as pelo corpo e pelos gestos da ac­triz?
Com Rueff, uma Rueff pam­pli­nesca e so­berba, rimos de forma in­te­li­gente, es­ti­vemos en­vol­vidos, du­rante uma hora, sus­pen­dendo tudo o que nos magoa, nesse má­gico ab­surdo feliz e poé­tico que o te­atro é, quando feito por pro­fis­si­o­nais cultos e sen­sí­veis.
 
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E nunca dispensamos o que 
João Carneiro escreve no Expresso.
Como regra, masterclasses sobre Teatro
 
“Elogio do Riso”, com Maria Rueff | Pedro Castanheira
 
Termina assim (o destaque é nosso): «(...)  Assim nasceu o “Elogio do Riso”, um monólogo em que Maria Rueff cria uma personagem que espera, num teatro, a chegada de uma companhia que vem representar Shakespeare. É um espetáculo feito de situações, e não de palavras, que são meramente episódicas. E é um espetáculo que homenageia, também, quer todos os cómicos que contribuíram para uma supremacia do riso e da alegria, quer os mestres que foram decisivos para a vida da atriz. O riso, como o teatro, é uma coisa que se ensina e que se aprende».
 

 

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