«Este TEVeD – Teatro
Espaço Vazio e Democracia – é sobre o teatro que fizemos, sobre o teatro que
fazemos.
Desta vez, é a sua nona edição, a palavra é dada aos espectadores. Em cena na
sala-estúdio serão eles os intérpretes, os protagonistas.
Convidámos um conjunto de espectadores que ao longo dos anos e de modo
constante e com amizade nos têm reportado as suas impressões e comentários
críticos – como diria Gramsci, e aqui repito, estes convidados são “um
exército de capitães”, são espectadores muito particulares e muito singular
será a relação que têm connosco – a metáfora dos capitães será datada, mesmo
que as armas estejam aí de volta, mas dá para perceber a lógica entre iguais
que a consubstancia. Não somos de comandantes e comandados.
De que se trata?
De testemunhos das várias gerações que connosco têm “feito teatro” nestes 41
anos de existência o que, no país que somos, não sendo milagre não estará longe
de o ser, conhecido o caminho de pedras desta arte de equipas e por isso
dispendiosa, em Portugal.
Testemunhos que cada um dos participantes elaborará a partir da memória,
porventura única, de uma noite, de um dramaturgo em particular, de um núcleo de
actores, de um espaço físico, de uma encenação. Mas também de lógicas de
repertório, de escolhas que praticámos e praticamos, das traduções efectivadas,
de cursos das coisas mais que de actos isolados, de insistências e repetições,
de combate pela língua, dos elencos e distribuições, de obsessão pelo rigor do
jogo de actor e suas cifras estilísticas, do registo gestual mínimo como
estética da contenção ao excesso grotesco e farsesco, ao burlesco, ao circo, ao
registo híper realista, ao récit de vie (Ella),
ao “kabuki”, à comédia aristofânica e à tragédia revisitada (Ajax e Antígona). Foram
esses os reptos lançados.
O objectivo será, entre outros, o de escapar neste acto único de projecção de
memórias, à velha dicotomia gosto / não gosto, ao vazio crítico em que
encerraram o teatro e de alguma forma o próprio debate social subsequente,
presos que estamos ao usar essa reacção clichê aos fluxos publicitários
adaptados à alucinação competitiva vertiginosa de tudo nestes tempos que nos
calharam viver. O tempo de maturar um comentário, de reflectir, não
existe, subsumido que está pela profusão de solicitações em agenda e pela
velocidade com que vão sendo substituídas nos ecrãs imperiais em que se
consomem e não lêem. Alguém pode imaginar que a versão integral do Fausto, de
Goethe, seja experiência de fruição possível e idêntica a um episódio de série
ou a umas variedades e graçolas requentadas na hora?
São coisas diferentes, bem sei, mas também sei que o entretenimento é imperial
e tudo ocupa. Nestes tempos miseráveis em que o pensamento não tem nem o
estatuto da gastronomia e seus chefs – é o mercado quem mais ordena – a
estupidificação é virtuosa e a tragédia diária tratada pelos grandes poderes
com cinismo racista ao mesmo tempo que é adornada de graçolas.
Relevante para esta arte única da simultaneidade presencial, única na medida
que é um outro da política pois materializa um parlamento sensível, é cumprir a
sua missão artística e cívica, permitir que cada um entre “o todos de uma
sala”, uma comunidade instante e nela o sujeito individualizado e ser social,
se aproprie de uma memória não descartável, experiência que pode regressar pela
vida fora em circunstâncias dadas, muitas vezes limite. Era esse o juízo que
Althusser fazia sobre a especificidade e singularidade do teatro, a sua força
para além do seu poder efémero no acto teatral. Essa potência da singularidade
de uma memória supera o seu carácter momentâneo e passa a ser parte do
sujeito espectador, ele incorporou-a – isso dizia Steiner acerca de “decorar”
uma poesia, ele falava de incorporá-la, de sabê-la de coração, de
cuore.
Serão intervenientes o Nuno Lopes, Arquitecto e Urbanista, a Paula Carvalho,
Psiquiatra, a Teresa Paula, Empresária, a Rita Faria, Professora Universitária,
a Inês Pereira, Professora, a Christine Zurbach, Professora Universitária, o
Luís Varela, Encenador, o José Ricardo Nunes, Poeta e Jurista, a Teresa
Albuquerque, Presidente da Fundação de Mateus, o José Luís Ferreira, Director
Artístico e Conselheiro Cultural, o Carlos Lobato, Jornalista, o António Mora
Ramos, Engenheiro, a Isabel Xavier, Professora, o Paulo Nuno Silva, Fotógrafo,
a Margarida Amaral, Professora, a Margarida Araújo, Fotógrafa, o Henrique
Manuel Bento Fialho, Poeta e Ensaísta e o José Serrão, Designer Gráfico e
Arquitecto».
Fernando Mora Ramos
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