Semanário Expresso |Revista | 9FEV 2019
EXCERTOS:
«A minha paixão pela ópera é por via do teatro. Creio que podia viver sem ópera; não saberia pensar sem ver teatro. Ao longo dos anos assisti a milhares de concertos e espetáculos de teatro e ópera, mas só uma vez saí no intervalo, exausto com tanta beleza sublime. (Voltaria uma semana depois, para então ver tudo do princípio ao fim.) Foi num espetáculo do National Theatre de Londres, ainda no vetusto Old Vic. Nos idos de 1967, as aspirações e ilusões da vida tratadas por Tchekov e postas no palco por Laurence Olivier (que encenava) com a simplicidade luminosa dos cenários de Josef Svoboda: “As Três Irmãs”, com a Masha inesquecível de Joan Plowright e o gauche Andrey de Anthony Hopkins, sem esquecer o Tusenbach de Derek Jacobi. (...)
Encontrei há semanas o maior dos Antonies, Ralph Fiennes! Sim, no Royal National Theatre de Londres, numa espetacular produção de Simon Godwin, com Sophie Okonedo a fazer a Cleopatra. Palco rotatório, com os cenários (Hildegard Bechtler) a diferenciar bem o Egito de Roma: opulência geométrica entrecortada por canais aquáticos, para um lado, gabinete de guerra com as últimas novidades da tecnologia por satélite, por outro. Sensacional a cena da batalha naval de Actium! Fiennes é um daqueles monstros sagrados do cinema (de “A Lista de Schindler” a “Grand Budapest Hotel”) que recarga as baterias no teatro. Antony é um papel ainda mais difícil do que o da carismática Cleopatra — um eloquente e bem-humorado homem de ação, com tentações hedonistas, destinado a falhar. (Okonedo deu-lhe excelente réplica.) Por cá, há muito que o teatro português perdeu o pé. Por falta de meios e de talento não pôde acompanhar a revolução técnica operada já neste século XXI por encenadores como Ivo van Hove. Em vez de estimular e ajudar, o Ministério da Cultura controla, ‘burrocratiza’, complica e estrangula. A ópera é o que sabe ou não sabe. Quando começam as obras? Os gestores vão continuar? No Museu de Arte Antiga, levantado do chão pela equipa do quase ex-diretor, é a debandada. O último disparate é a transferência do Museu Nacional da Música para Mafra. Estudaram o caso, perguntaram aos interessados, estimaram as consequências? Não. É sim, porque sim. Já deu para perceber que esta é o pior ministro da Cultura de sempre (e havia vasta competição para o troféu). Como dizia a minha avó, há gente que quando abre a boca, ou entra mosca ou sai asneira. Pensar é difícil, mas ajuda ver teatro».
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Como prolongamento do artigo, sugestão do Elitário Para Todos:uma incursão ao site do National Theatre. E apetece gritar, «Também queremos!».
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