terça-feira, 21 de janeiro de 2025

QUANDO OS «NÃO ESPECIALISTAS» SE DEIXAM LEVAR PELOS «ESPECIALISTAS» NA COMPREENSÃO DE PROBLEMAS QUE NOS RODEIAM ESTARÁ A CUMPRIR-SE NATURALMENTE NÃO O ESGOTANDO OBJETIVOS DE INVESTIGAÇÃO| foi o que nos ocorreu ao lermos o artigo «Terá o mundo pós-colonial acabado com os impérios? | DE DIOGO RAMADA CURTO NO EXPRESSO

 

 
O artigo da imagem, como se pode ver, saiu no semanário Expresso de 10 de janeiro 2025 - se tem acesso online é aqui - e começado a ler avança-se sem parar porque o texto de investigador é de uma clareza acessível, a nosso ver, a todos. Não perca, apetece dizer, nomeadamente porque ajuda a compreender o mundo de hoje para lá das «banalidades» que chegam até nós via colunistas e comentadores que nascem a um ritmo alucinante. Quase ao acaso estes excertos, como «aperitivo»:
«(...)O segundo exemplo foi protagonizado por um conjunto de intelectuais que, nos anos finais da República, se reuniram em torno da Biblioteca Nacional. Jaime Cortesão, Raul Proença, António Sérgio, Aquilino Ribeiro e muitos outros — republicanos e democratas, sem peias de enfrentar os problemas do presente, criticando a República, tanto quanto a emergência dos fascismos — procuraram, entre 1919 e 1927, ou seja, até à emergência do que se veio a designar por Estado Novo, levar a cabo um ambicioso programa de reforma da cultura portuguesa. Ao mesmo tempo, afirmaram o seu interesse pela história e pela literatura, enquanto chaves de interpretação da comunidade nacional. Nos ensaios de Sérgio, ou seja, nessa maneira de raciocinar a partir da colocação de problemas, encontra-se a mesma denúncia da inutilidade da erudição, constituída como um fim em si mesmo. Tal como veio a suceder com os “Annales”, também o grupo da Biblioteca Nacional mostrou: a sua preocupação pelo presente; uma atenção às estruturas e aos processos sociais que o podiam explicar; bem como um modo de operar com base em problemas, em parte, suscitados pelo presente.

Três projetos

Num livro recente de Jane Burbank e Frederick Cooper, dois historiadores norte-americanos que ensinaram na New York University, damo-nos conta de um renovado interesse em refletir sobre os problemas do presente. A seu modo, ele é comparável ao que demonstraram os historiadores dos “Annales” e, antes deles, o grupo da Biblioteca Nacional. “Post-Imperial Possibilities: Eurasia, Eurafrica, Afroasia” (Princeton UP, 2023) foi objeto de uma concorrida discussão, muito recentemente, num fim de tarde da Biblioteca Nacional de Portugal, na sequência de um evento semelhante organizado, na Universidade de Coimbra, por Miguel Jerónimo e José Pedro Monteiro. Burbank é uma conhecida historiadora do império russo, enquanto Cooper se especializou na história de África, com especial incidência na denominada África colonial francesa. Em 2010, ambos publicaram uma história dos impérios e dos processos de formação das sociedades coloniais, intitulada “Empires in World History. Power and the Politics of Difference” (Princeton UP).

No seu novo livro, Burbank e Cooper põem em causa uma das interpretações mais generalizadas da história dos séculos XX e XXI, centrada na existência de um processo linear de passagem dos impérios aos Estados nacionais. No entender dos autores, os nacionalismos, alguns fortemente anticoloniais, não fizeram desaparecer as aspirações imperiais, nem as federações ou as formações políticas situadas além do modelo do Estado-nação. Do ponto de vista dos projetos imperiais ou orientados para a construção de grandes espaços de convergência ou integração, existem diferentes tempos de intensidade exemplar e será possível fazer uma história comparada de três formações que foram recorrentes ao longo do século XX.

«(...) Por sua vez, a Comunidade Europeia acabou por se transformar numa espécie de projeto falhado, talvez mesmo numa desilusão ou pelo menos numa experimentação política em aberto, devido ao facto de se ter mostrado incapaz de captar a imaginação política ou de conseguir motivar, na sua defesa, os próprios europeus que dela beneficiam. Enfim, o mundo do presente, escusado será negá-lo se tivermos em conta os cálculos de Piketty e outros economistas, aponta para desigualdades crescentes, desde a Segunda Grande Guerra; e, se é certo que muitos são os movimentos que procuram um remédio para a pobreza, também aumentam os movimentos de aguda xenofobia e de recreação, crescentemente confiante, do racismo em relação aos imigrantes. (...)».

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Levados pelo artigo fomos em busca de mais.
Obras mencionadas:
 

«Synopsis "empires in world history,power and the politics of difference"

How empires have used diversity to shape the world order for more than two millennia Empires--vast states of territories and peoples united by force and ambition--have dominated the political landscape for more than two millennia. Empires in World History departs from conventional European and nation-centered perspectives to take a remarkable look at how empires relied on diversity to shape the global order. Beginning with ancient Rome and China and continuing across Asia, Europe, the Americas, and Africa, Jane Burbank and Frederick Cooper examine empires' conquests, rivalries, and strategies of domination--with an emphasis on how empires accommodated, created, and manipulated differences among populations. Burbank and Cooper examine Rome and China from the third century BCE, empires that sustained state power for centuries. They delve into the militant monotheism of Byzantium, the Islamic Caliphates, and the short-lived Carolingians, as well as the pragmatically tolerant rule of the Mongols and Ottomans, who combined religious protection with the politics of loyalty. Burbank and Cooper discuss the influence of empire on capitalism and popular sovereignty, the limitations and instability of Europe's colonial projects, Russia's repertoire of exploitation and differentiation, as well as the "empire of liberty"--devised by American revolutionaries and later extended across a continent and beyond. With its investigation into the relationship between diversity and imperial states, Empires in World History offers a fresh approach to understanding the impact of empires on the past and present». Saiba mais.

 

 

«After the dissolution of empires, was the nation-state the only way to unite people politically, culturally, and economically? In Post-Imperial Possibilities, historians Jane Burbank and Frederick Cooper examine three large-scale, transcontinental projects aimed at bringing together peoples of different regions to mitigate imperial legacies of inequality. Eurasia, Eurafrica, and Afroasia—in theory if not in practice—offered alternative routes out of empire.
The theory of Eurasianism was developed after the collapse of imperial Russia by exiled intellectuals alienated by both Western imperialism and communism. Eurafrica began as a design for collaborative European exploitation of Africa but was transformed in the 1940s and 1950s into a project to include France’s African territories in plans for European integration. The Afroasian movement wanted to replace the vertical relationship of colonizer and colonized with a horizontal relationship among former colonial territories that could challenge both the communist and capitalist worlds.
Both Eurafrica and Afroasia floundered, victims of old and new vested interests. But Eurasia revived in the 1990s, when Russian intellectuals turned the theory’s attack on Western hegemony into a recipe for the restoration of Russian imperial power. While both the system of purportedly sovereign states and the concentrated might of large economic and political institutions continue to frustrate projects to overcome inequities in welfare and power, Burbank and Cooper’s study of political imagination explores wide-ranging concepts of social affiliation and obligation that emerged after empire and the reasons for their unlike destinies». Saiba mais.


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