quinta-feira, 9 de abril de 2020

SARA BARROS LEITÃO | «Algo está podre no Ministério da Cultura»



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Excertos:

«(...)O decreto publicado privilegia o reagendamento das actividades, embora nenhum de nós saiba quando e de que forma isso vai voltar a acontecer. Além do mais, o não pagamento integral na data acordada, transferindo a totalidade ou parte desse valor para o momento do reagendamento, é uma forma de perpetuar e reforçar a precarização do sector, uma vez que os trabalhadores terão de sobreviver agora com uma parte, e depois com o resto. Como se alguém pudesse viver os próximos meses apenas a comer o pequeno-almoço (o correspondente a 30% do pagamento), e daqui a um ano, na nova data de apresentação, apenas comendo o jantar e um copo de leite antes de dormir (correspondente ao resto).
(...)
 Ainda assim, a realidade do tecido cultural em Portugal é muito mais diversa e é urgente encontrar outras soluções. Foi neste sentido que o Ministério da Cultura lançou uma linha de apoio no valor de um milhão de euros, que seria gerida pela DGArtes. Todos os profissionais o disseram, e tal como o sindicato do sector CENA-STE fez chegar à ministra, esse valor é altamente insuficiente. E, viemos nós depois a descobrir, estava mascarado de concurso, o que obrigou os agentes culturais a desenvolverem novas candidaturas que iriam ser avaliadas, cotadas, e, posteriormente, apoiadas ou não.
Não são essas as medidas de um país com o mínimo de pensamento de política cultural. Mas, como em qualquer tragédia, nada se resolve no primeiro acto, embora ninguém esperasse que a nova entrada em cena da ministra Graça Fonseca fosse tão desastrosa como aquilo que esta quarta-feira anunciou.
Assumindo a sua inspiração nas tais reacções iniciais dos artistas, Graça Fonseca anunciou que o MC pretendia criar um TV Fest. Numa reportagem da RTP é possível assistir ao triste espectáculo de ouvir a ministra, em jeito de programadora, a falar sobre o festival que ela própria criou.
Algo está podre no Ministério da Cultura. É importante lembrar que o Ministério não deve fazer curadoria nem ser promotor de festivais, no entanto, podemos ouvir Graça Fonseca dizer à imprensa: “Nós convidámos o Júlio Isidro, uma pessoa muito querida de todos nós e com muitos anos precisamente a descobrir artistas”, “a nossa ideia é que…”, como se de uma curadoria se tratasse, ou como se coubesse ao Ministério a descoberta de novos talentos.
Depois, é anunciado um investimento de um milhão de euros para um festival que será divulgado na RTP e na RTP Play. Será importante lembrar que a RTP recebe directamente mais de metade do orçamento para a Cultura. Que sentido faz que a mesma tenha um reforço de um milhão para fazer aquilo que é já a sua missão, e para a qual já está a ser financiada?
Por último, o festival é anunciado como uma medida que pretende proteger artistas e técnicos, embora os concertos sejam gravados pelos artistas nas suas próprias casas. (...)»

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