segunda-feira, 26 de agosto de 2024

LEONEL MOURA | «O artista já não é aquele que cria as coisas, mas desencadeia processos que vão levar à criação».

 

se puder não perca
 
Excertos:
 
«(...) Isso é uma espécie de recuo até ao tempo em que o artista era secundário em relação à obra.
Nesse sentido, talvez. Ao libertar o artista disso, o que podemos questionar é então qual é o papel do artista humano. O artista já não é aquele que cria as coisas, mas desencadeia processos que vão levar à criação. É o meu caso com os meus robots. Com os meus robôs não pinto nada, eles é que pintam e nunca sei o que vão pintar, não tenho controlo algum a partir do momento em que eles começam. Isto dá origem a um novo tipo de arte em que a componente não humana é muito importante e mesmo fundamental, para que se dê origem a uma obra. Depois, algumas pessoas podem dizer que não é arte, outras dizem que é arte, mas isso é uma conversa com que andamos há um século e já não tem interesse. Nunca teve, aliás. Por isso, vejo esta evolução como muito positiva. Considero os criadores de algoritmos dos artistas mais importantes do meu tempo. Isso é que é um artista do meu tempo e não quem pinta um quadro. É porreiro, não tem mal, mas não tem interesse. Agora, quem faz certos algoritmos é que é um verdadeiro criativo. (...)

Sente que estamos no princípio de uma grande conversa?
Sim, aquilo que se pode prever da evolução da IA vai ter um impacto brutal no mundo. Eu já disse que gostava de ver na Assembleia da República um ou outro deputado de IA, o Chat GPT na Assembleia da República como deputado. Fazia muito melhor do que os outros todos. Eu gostava de ver um ministro que fosse o Chat GPT.

Podia ser um ministro da Cultura?
Sim, sim. Aliás, propus substituir o anterior ministro, que não fez nada, como é o costume na Cultura. O que é que podem fazer? Criam mais uma instituição, menos uma instituição, dão mais um subsídio, menos um subsídio, mas isso serve para quê? Não serve para nada. Diz-se que o Chat GPT é tendencioso. Pois é, porque o seu conhecimento assenta em bases de dados, e até há uns tempos, 60 por cento das bases de dados eram americanas. Em português eram 0,3 por cento, dos quais quase todas brasileiras. Portugal tinha uma ou duas. Não temos, até porque a malta não percebe que uma base de dados para a IA não é a lista das coisas que a gente tem no computador. Se queremos existir, qual é que é a melhor defesa do património? É digitalizar tudo, mas tudo. Digitalizem a obra de Eduardo Lourenço toda. Tenho feito imensa pressão para isso – para nada. É a única maneira de preservar o conhecimento. Uma base de dados para a IA é uma lista com links. Mas a própria inteligência artificial vai aprender a fazer essas conexões. Ela constrói a própria rede. Tivemos agora umas eleições. Ouviu alguém falar de IA na campanha? Zero. E é dos assuntos mais importantes do nosso tempo, a par do ambiente. Tenho insistido com alguns deputados que conheço para se fazer um debate sobre IA até agora nada. Não querem. Estão a leste. (...)».


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