Um excerto do que escreve o Diretor Artístico da CTA, Rodrigo Francisco, e se pode ler na brochura da imagem:«Caminhar de perto - (...) O TMJB integrou recentemente a Rede de Teatros e Cineteatros Portugueses: o investimento por parte do Estado central nesta Programação vem acrescentar-lhe alcance internacional e consolidar a prática de acolhimento dos mais destacados criadores e intérpretes portugueses. Este ano voltamos a cruzar distintas gerações de artistas, opções estéticas, e formas de olhar e de estar no Mundo. Receberemos ainda as iniciativas promovidas pela Casa da Dança e pelo Festival de Música dos Capuchos. Anima-nos o desejo, cunhado por Antoine Vitez, de “um teatro de elite, para todos”, que procuramos proporcionar aos que nos acompanham, não cedendo à demagogia nem ao facilitismo. E saudamos com ânimo renovado aqueles que têm decidido caminhar de perto connosco: entramos em 2023 com mais de uma centena de membros do Clube de Amigos em relação ao início do ano passado. Aproximamo-nos a passos largos dos índices registados antes da pandemia. Até ao final do ano havemos de ultrapassar essa marca».
Depois disto, ou seja, de trazermos para aqui a imagem inicial que se refere à apresentação da Programação da Companhia de Teatro de Almada para 2023, a que se acede seguindo o link da segunda imagem, é, como está na moda dizer, incontornável não reparar naquela multidão que aflui ao Teatro Municipal Joaquim Benite para saber que espetáculos e demais atividades vai haver no ano que começa. Para quem já assistiu, é um acontecimento que toca, reencontro e começo vivificantes: misto de festa, com grande alegria, e de cerimónia ritual seguida atentamente com momentos de grande silêncio. Uma expressão de respeito pela arte?, muitas vezes assim se interpretou. Ora, o que acontece ali, e o que nos é prometido para o novo ano teatral, faz-nos lembrar frequentemente o «Eu Vim de Longe de José Mário Branco» :
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Eu vim de longe
De muito longe
O que eu andei p'ra'qui chegar
Eu vou p'ra longe
P'ra muito longe
Onde nos vamos encontrar
Com o que temos p'ra nos dar
....................................
E também as palavras abaixo de Joaquim Benite, a que aliás nos referimos recentemente em outro post, que se pode dizer em linha com o que se tem ouvido no protesto pelas artes, em curso, na sequência dos resultados dos concursos da DGARTES, um movimento que se foi alargando à designada sociedade civil:
«Há 30 anos, fazíamos bailes ao fim de semana para arranjar dinheiro para manter uma peça de teatro. Bastava alguma flanela preta e pouco mais para entrarmos em cena. Hoje isso já não é possível, porque o público é muito mais exigente. Demos-lhe a escada e deitamo-la fora. Cedo demais. Criar público é uma tarefa que exige prudência e audácia, faz-se fomentando uma relação sólida com a comunidade, com as escolas, requer um trabalho de cariz social … São práticas que levam anos a desenvolver mas que quando travadas são fulminantes: matam o público. Recuperá-lo é impossível». E avisou: «Desenganem-se os nossos governantes se pensam que mantendo apenas a porta aberta alguém vai entrar». Joaquim Benite - Expresso 2012/07/21.
Parabéns, e obrigado, pelo presente e pelo passado, Companhia de Teatro de Almada. Por terem conseguido contrariar o efémero e nos proporcionarem uma estabilidade de oferta cultural rara para os nossos padrões: para adultos e para infância e juventude.E assim nos sentimos também elites.
E agora, em especial para os agentes culturais e demais interessados «em protestar pelas artes», mas também para os governantes, ao longo do seu trajeto a CTA teve momentos difíceis, as suas pedras no caminho, o que foi frequentemente mediático, e mobilizaram solidariedades e cumplicidades. Sofreu injustiças - que nem sabemos em que medida já foram revertidas (era muito útil o historial dos «apoios», nomeadamente referenciado ao que acontecia em 2009) -, e os júris (ou equivalentes) não tinham razão Senhor Ministro da Cultura, como o tempo, «esse grande escultor», nos mostra. Erraram. Imagine que na CTA tinham «atirado a toalha ao chão», o que nós, públicos, teríamos perdido... O património imaterial e material (sim, aqueles cenários, o guarda-roupa, os adereços, os elementos das exposições ..., valem por si, e hoje podem inserir-se de maneira apropriada na tão propalada economia circular ) que o País de Cultura não teria experienciado. Que perdas!
E necessariamente tem de se dar destaque ao Festival de Teatro de Almada, grande obra da CTA/TMJB com lastro internacional. Que venha julho!
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Notada a exemplaridade da CTA, peguemos no seu caso para reflexões mais amplas aproveitando a atmosfera do protesto pelas artes, em busca de algo maior: de um Serviço Público de Cultura, onde uma REDE NACIONAL DE ARTES, centrada na criação, em substituição do atual modelo de ajuda às artes. Agora o Teatro, mas na certeza que apontamentos como os seguintes podem ser alargados às demais artes. Assim:
- A CTA, comparando com o que se passa lá fora, com naturalidade poderia ser um Centro Dramático Nacional de França ou um STABILE (Nacional) de Itália. A propósito lembre-se post recente em que o Teatro da Rainha se assume como um Centro Dramático e onde adianta proposta em direção a uma reordenação em função da nossa realidade: SERVIÇO PÚBLICO DE CULTURA | ALÉM DA TIRANIA DO URGENTE NA ESFERA DOS «APOIOS ÀS ARTES» EM CURSO| «a rede das estruturas de criação que poderia dar sentido à rede de teatros e cineteatros» . Voltemos também ao artigo que desde há muito continuamos a destacar na coluna ao lado:FERNANDO MORA RAMOS | «O insustentável modelo do apoio sustentado».
- Mas por aqui, no Elitário Para Todos, há quem vá mais longe, e defenda que se considere a existência de mais TEATROS NACIONAIS no País. Não para mimetizar os que já existem. Mas para o que já provou, ser o que é, em crescendo - e não estar sempre a começar do zero -, pois a sua identidade e trabalho feito mostram que pode ter CATEGORIA maior para benefício da qualificação de REGIÕES e assim contribuir para se harmonizar o desenvolvimento global do País. Descentralizar, verdadeiramente. E, por exemplo, num outro ângulo, para se distinguir PROJETO CULTURAL DE EXCELÊNCIA. Por mais de uma vez se ouviu o saudoso Joaquim Benite dizer que a CORNUCÓPIA devia ser um Teatro Nacional. Como estamos de acordo! E agora somos nós a sugerir (já o temos feito) que se olhe para o que Benite nos deixou - e que inteligentemente está a ser continuado -, isto é, para a sua Companhia de Teatro de Almada, e para aquela dinâmica TMJB - onde gerações diferentes, sabiamente, se continuam a cruzar - adiantando-se que se considere a possibilidade de institucionalmente ser um «NACIONAL». Sem favor. Com estabilidade estratégica. E o País ficaria a ganhar.
- Ainda uma outra nota, aproveitando a realidade CTA/TMJB, e até porque a Rede de Teatros e Cineteatros é referida na Programação para 2023, outro olhar nosso: unifique-se a RTCP com «o sistema de apoios». E de uma vez por todas, em vez de «ajudar», o Estado assuma que tem de «garantir», começando por mostrar o que devemos ambicionar espalhado pelo País - como acontece com outros Serviços Públicos. Só o trabalho que dão as diferentes candidaturas ( e disto tanto se falou na audição no Parlamento organizada pelo PCP) justificaria a unificação. Se precisarmos como se avaliam coisas como «profissional», «sem fins lucrativos», «amador», «comercial? etc., etc .... racionalmente não há porque estar separado. O que se passa na Guarda, pode ser «condenável» mas traga-se para a reflexão. Atente-se no regulamento da RTCP: curiosidade abunda. Exemplificando, como se avaliará o seguinte, no que se tem particular interesse até porque se defende que as indústrias culturais e criativas ordenadas pelo mercado devem ser tratadas em algum lugar:
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Para encerrar, e não é nostalgia - (está bem, um bocadinho) -, mas até no caminhar de perto com o seu público enunciado na Apresentação da Programação 2023 da CTA, a coisa vem de longe:
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