segunda-feira, 7 de setembro de 2020

LUÍS RAPOSO | «O "novo normal" nos museus»

 

 

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Excerto:

«(...)No campo vasto da cultura, o mesmo ímpeto digital percorreu por estes meses criadores, mediadores e empreendedores. Tudo se procurou fazer por via remota, a distância. Tudo mesmo: leitura dita comum de clássicos da literatura, audição dita imaginativa de música sem músicos, teatro dito comunitário, visitas ditas educativas a museus e monumentos… e debates, muitos tele-debates, tantos que fartaram. Especialmente ocupadas estiveram as chamadas “indústrias criativas”, que cavalgaram exuberantemente a pandemia e o confinamento, vendendo novos produtos, abrindo novos negócios. 

Inversamente, os artistas propriamente ditos viram-se desapossados de quase tudo e mergulharam em poço profundo. Isto foi e ainda é em parte assim especialmente no caso das chamadas artes performativas, onde, por muita e embasbacante pirotecnia que se use, não há como substituir o conjunto de sensações físicas imediatas da música, do teatro ou da dança assistidas ao vivo – a única forma pela qual qualquer destas e de outras formas de arte merecem realmente os nomes que transportam desde remota antiguidade, porventura desde sempre.

 E os museus, como se posicionam eles neste quadro? Bom, também aqui os meses que passaram constituíram terreno fértil de afirmação de quem já do antecedente se extasiava com o digital e o virtual, encontrando neles propriedades disruptivas (v. Os museus e o mundo virtual: amigos ou inimigos?, Público, 16.5.2018), quer dizer, capacidades de não apenas aprofundar e melhorar práticas sedimentadas, mas de verdadeiramente “revolucionar” os museus, tornando-os outra coisa, servida por outros agentes. Foi, e continua em parte a ser, o tempo dos vendedores de linguajar (providers de hardwaresoftwareappsgamesdevices, gadgets, etc.), que as tutelas dos museus, receberam-nos de braços abertos, porque ninguém deseja passar ao lado do que “está a dar”. Pôde nestes meses não haver dinheiro para reformular espaços expositivos e reservas, para conservar e estudar colecções, porventura editar catálogos, para contratar pessoal, em locais onde os técnicos habilitados vão rareando como água em deserto… mas houve para comprar produtos encantatórios: cenas de vida mais avançadas do que o antigo technicolor em cinemascope e quase tão boas como as dos efeitos especiais por computação gráfica, reconstituições melhores do que rudimentares hologramas e quase tão perfeitas como as dos ambientes tridimensionais imersivos. (...)».


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