quarta-feira, 6 de março de 2024

MAS QUEM OS OUVE? | na circunstância profissionais das artes performativas

 

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Nesta «Babel» em que se transformou a comunicação social como dar atenção ao que devia merecer atenção? Vem isto a propósito do trabalho de Cristina Margato a que se refere a imagem acima. A nosso ver, os depoimentos recolhidos dizem muito, e muito do que  é essencial. Os inquiridos: Armando Valente; Rui Horta; Patrícia Portela; Rodrigo Francisco. Ler tudo é o que se sugere. Entretanto,  o que disse PATRÍCIA PORTELA - na nossa leitura,  faz diagnósticos «desassombrados» de quem tem voz própria e não se deixa afogar pelo mainstreaming, mostra que «tudo está em tudo», e cada palavra - por maior força de razão, frase ou pensamento -  não o podem esquecer ... Refletir outros paradigmas para o pensamento, novos modelos para a ação, é o que emerge das suas palavras. E, sim,  o mundo é a nossa tarefa.

 

 « (..) PATRÍCIA PORTELA, AUTORA E DIRECTORA DAS GAIVOTAS 6
"São vários os partidos que referem a importância da autonomia das instituições culturais tuteladas pelo Estado ou avançam com propostas de aumento do orçamento para a cultura sem uma orientação específica. No entanto, todos parecem apostar numa necessidade de tornar este num sector mais lucrativo, financeiramente independente ou com um orçamento mais ou menos participativo (consoante as ideologias), cumprindo lacunas que deveriam ser obrigações transversais do estado (acessibilidade, luta contra a descriminação, temáticas actuais como a revolução ou a crise climática) esquecendo a natureza subjectiva, orgânica, rizomática e desconhecida do trabalho artístico, assim como o seu papel fundamental na reflexão sobre a sociedade e os seus males maiores.
O anterior governo dedicou-se com afinco a construir programas de apoio, redes de teatros, cinemas e galerias, planos nacionais de artes leitura e de coesão territorial que consomem grande parte do orçamento para as artes e regulam de forma sufocante o sector impondo condições e percentagens de envolvimento com câmaras, instituições sociais ou culturais da dgartes ou outras que afunilam o apoio e a criação para um grupo muito reduzido de grandes companhias e deixa de fora a grande maioria das associações e artistas que desempenham, muitas com carácter diário e intensivo, um papel dinamizador nas suas regiões longe do olhar e influência do estado central.
Nos últimos anos assistimos a uma proliferação de medidas teóricas que se concretizaram em projectos desmesuradamente burocráticos e permanentemente publicitados pelos órgãos estatais como um sucesso que na prática não existe. Multiplicam-se em observatórios, em conselhos culturais, instituições de serviços públicos da Cultura, em departamentos de apoio, atribuição e avaliação de medidas de implementação culturais que consomem os orçamentos que deveriam ser aplicados no terreno.
A Rede de Teatros e Cineteatros Portugueses (RTCP) apoia-se numa relação entre as câmaras municipais e a Direcção Geral das Artes que afunilou as programações das câmaras que são obrigadas a cumprir percentagens de espectáculos com apoio da DGArtes e com itinerâncias garantidas já com outros teatros; privilegiando os artistas e companhias que já têm um circuito organizado e sólido e uma relação estabelecida com as instituições.
O Rede Portuguesa de Arte Contemporânea (RPAC), cujo logotipo já percorre o país assim como a sua merchandising com saquinhos e canetas bonitas, ainda não distribuiu um único apoio, tendo o primeiro concurso fechado a meio de janeiro, desconhecendo as datas para os resultados.
Os programas de apoio da DGArtes são feitos através de candidaturas e formulários que uniformizam as propostas e as avaliam por critérios de majoração políticos e financeiros ao invés de artísticos (que são considerados subjectivos). Deixam-se cair financiamentos a projectos fundamentais por décimas na avaliação geral de um projecto, não havendo mecanismos de resgate e avaliação de projectos que são no terreno imprescindíveis mas não obedecem aos critérios burocráticos das plataformas de candidatura.
Neste momento, as artes performativas que se desenvolvem no país obedecem a temas e a objectivos estatais ou são realizadas por artistas que têm acesso a financiamentos próprios, não estando dependentes dos apoios do estado ou da comercialização das suas obras para sobreviverem. Isto implica que temos uma arte que não é feita por diferentes classes, com diferentes perspectivas sobre a sociedade; e sim uma arte realizada por uma elite privilegiada (e ainda assim grande bem haja pelo amor à camisola) ou por um sector exausto que trabalha em quatro turnos por dia para manter a casa, reduzindo, em muito, a variedade de temas, de linguagens e de propostas artisticas ou, simplesmente a sua qualidade.
Deveríamos apostar em incentivos fiscais e condições laborais para exercer a actividade artística e para usufruir de objectos artísticos como espectadores, ao invés de burocratizarmos a distribuição dos seus apoios ou de sobrecarregar as companhias com obrigações (financeiras contratuais e sociais) que deveriam ser condição 'sine qua non' transversal a todas as profissões e não um critério de majoração de um projecto artístico que, como se sabe, pode ser construído de muitas formas e seguindo muitos modelos.
Fala-se na realidade do sector mas ninguém o conhece nem existe vontade de dialogar. Os mecanismos de acompanhamento e de avaliação são descorados ou existem em regime de recibos verdes tornando também precária a própria fiscalização e avaliação dos processos de criação.
Em suma, um país que deseja ensaiar o seu futuro e experimentar novos formatos de sociedade e de comunhão tem de aposta nas artes performativas, visuais e literárias como veículo primordial de reflexão e experiência de novos modelos. Não pode ser um país que prefere exibir a arte e a cultura como um crachá que confirma as suas políticas (culturais e outras), correndo o risco de cristalizar a sua sociedade e o seu progresso." (...)».
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Para terminar, não podemos deixar passar isto que disse Rodrigo Francisco  da Companhia de Teatro de Almada:  «(...) também não me esqueço de que foi durante a vigência de um Governo liderado pelo Partido Socialista que o Teatro da Cornucópia fechou, por financiamento insuficiente."». Uma frase que é toda ela um BALANÇO de que ninguém se pode orgulhar. Ou seja, que País é este  que se dá ao luxo de  dispensar EXCELÊNCIA! 


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