sábado, 20 de abril de 2024

«Se não, é a “carneirada” – mesmo se não gosto de usar esse termo depreciativo. A gente abre a televisão e é só mainstream. Isso foi das piores coisas que aconteceram com o capitalismo, com a lei do mercado. O share na televisão deu cabo de tudo o que era mais alternativo. Disso tenho medo, porque a diversidade era boa»

 

 
É mesmo de dizer: se puder 
não perca. Se tem acesso a entrevista da imagem está aqui.
  Excerto  (o destacado é nosso sobre o Mainstream):

 

«(...)  Passados 50 anos, como estão a viver os tempos de hoje?
ML – Estou preocupado…
PB – O mundo mudou muito. A principal diferença relativamente a há 50 anos é a aceleração, principalmente nos últimos 30, 20 anos. Ela é de tal ordem – e acho que isso traduz a preocupação de que o Mário fala – que a gente não tem tempo para assimilar nada. E até o pensamento crítico se perdeu. No caso específico das artes, houve sempre uma componente crítica, mas informada, não é dizer mal ou dizer bem, é saber do que se está a falar. Isso desapareceu. Hoje há “comentadores”, uns mais informados do que outros, claro, mas o mundo acelerou tanto que se perdeu o tempo de reflexão.
Mário Laginha e Pedro Burmester em entrevista: uma cumplicidade firmada na liberdade da música
ML – Não quero ficar pelos lugares-comuns, mas nós pertencemos a uma geração que viveu um período muito bom, mesmo se não é perfeito. Sem o 25 de Abril, não teria sido músico de jazz, por exemplo… O jazz não chegava a Portugal…
Mário Laginha e Pedro Burmester em entrevista: uma cumplicidade firmada na liberdade da música
Chegava com o Luís Villas Boas…
ML – Sim. Apareceu esse “louco”, no melhor dos sentidos, que tinha uma paixão tal que conseguiu fazer um festival de jazz [em Cascais]. E o jazz começou depois a ter mais gente, mesmo se já tinha antes do 25 de Abril. Foi um período de esperança. Aquilo que faz com que o presente seja melhor não é que tudo esteja resolvido, é sentirmos esperança. O país é melhor agora, há mais gente a viver bem do que há 50 anos, o grau académico aumentou, as pessoas sabem ler e escrever, quando então havia uma percentagem de analfabetos, imensa. Mas tenho dificuldade em perceber a atracção que as pessoas agora têm por uma direita, por alguém de pulso de ferro. Mesmo se isto não é uma coisa portuguesa, há em países como aqueles em que se vive melhor, os nórdicos, com um estado social muito forte. E isso preocupa-me, porque temos filhos e netos…
PB – Isto tem também a ver com a mudança rápida de que estava a falar. O ano de 2024 é igual para todos, mas a tua análise sobre a esperança ou a falta dela é uma, falando aqui, é outra, falando no Peru; outra, falando no Senegal, ou no Laos… Não sei se nesses lados há tempos de esperança. É preciso relativizar as coisas. Estes saltos tão rápidos, muitas vezes deixam pessoas para trás, e não me refiro só à questão social, ou da justiça ou da riqueza, mas também à cultura. Se calhar, às vezes, também temos de andar todos um bocadinho para trás, para levarmos depois mais gente para a frente. E aí a esquerda tem alguma culpa, ao achar que nós é que estamos certos e os outros estão errados. O mundo não é a preto e branco.
ML – Mas há agora muita música popular em que se criou uma exigência de haver um lado visual. A sociedade tornou-se tão visual…
No seu caso, o jazz é, por definição, a expressão da liberdade, do improviso.
ML – A arte contém a liberdade, de alguma forma. Uma pessoa não consegue criar se se sentir presa a parâmetros, a conceitos. Se não quiser nunca pô-los em causa, provavelmente não vai acontecer nada de verdadeiramente artístico. Concordo, e tenho estado também a pensar nisto que o Pedro estava a dizer. Para mim, tornou-se uma espécie de obrigação, entre as pessoas com quem contacto – e algumas das “vítimas” são mesmo os meus filhos –, dizer-lhes isto: “Antes de responderem que não gostam, experimentem, conheçam”. O conhecimento é o melhor passo para uma pessoa ter ideias, pensar com mais propriedade e sustento.
Se não, é a “carneirada” – mesmo se não gosto de usar esse termo depreciativo. A gente abre a televisão e é só mainstream. Isso foi das piores coisas que aconteceram com o capitalismo, com a lei do mercado. O share na televisão deu cabo de tudo o que era mais alternativo. Disso tenho medo, porque a diversidade era boa. (...)».

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Não resistimos, e agradecemos o ponto de vista que acabámos de destacar porque nos revemos nele, e ali está numa expressão forte e clara - a necessária. Ousamos acrescentar: as políticas públicas na esfera da cultura e das artes  no nosso País (embora não existam  estruturadas, há o praticado) não contrariam isso - o «mainstream» é o ambicionado -, nomeadamente pelo que acontece via Ministério da Cultura/DGARTES ...  O nosso referencial é transparente: cada PROJETO ARTÍSTICO deve ser único, o que deve ser favorecido. Ora, a intervenção CONCURSAL que nos afoga está longe desse horizonte. Quantas das vezes a comparar-se e a hierarquizar-se  o que é impossível. É DIFERENTE por natureza - «graças a deus!»...



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